sábado, 16 de junho de 2012

CÂMARA CASCUDO


Algumas palavras desse pensador e professor nordestino que nasceu em Natal (RN) e viveu de 1898 a 1986.


Sobre o que somos ou deveríamos ser...

Creio na bondade sem a garantia prévia da gratidão. Sem que se assegure da memória devedora. Sem que se estabeleça, pelo ato generoso, uma servidão vitalícia no beneficiado. Bondade paga-se no puro e simples ato de sua realização. Como um fruto justifica a existência útil da árvore. Bondade antevendo a recompensa é apólice de sociedade mutualista rendendo do capital intocável do favor inicial. Os pássaros não são devedores dos frutos e da água da fonte. Eles testificam, perante a natureza, a continuidade da missão cultural.

(O Tempo e Eu. Cascudo, Luís da Câmara. Natal: UFRN/Imprensa Universitária, 1968) 

Sobre a Vida e a Passagem do Tempo...

Hora de recolher... Ao alvorecer, mandei minhas caravanas na pista da vida. Para o amor, à glória, ao poder, à fortuna, à amizade... Voltam ao anoitecer. Uma perdeu-se no deserto, varrida pelo turbilhão de areia, perseguindo miragens. Outra está vazia. Esta, exausta, nada conquistou. Aquela trouxe alguma esperança. O sol desce no horizonte vermelho. A sombra nos cobre. Tranqüilo, ao pé da tenda, olhando o poente, aguardo o regresso da última caravana. 

(Citado em O Colecionador de Crepúsculos. BarretoAnna Maria Cascudo.
Brasília: Senado Federal, 2003) 

Pertenci ao século das transformações e dos contrastes. Assisti ao acender dos lampiões, quando Natal não tinha luz elétrica; vi carros-de-boi e remei de iole, passando em frente onde é hoje o Teatro Alberto Maranhão. Pela televisão, observei o homem descer na lua (com o pé direito, mostrando que as superstições são eternas); sou testemunha desta absurda verticalização, da triste ausência dos quintais, e já voei (apavorado) nos mais modernos aviões que encurtam distâncias. Mas encaro tudo com normalidade. A inteligência, em última análise, é a capacidade de adaptação. 

(Citado em O Colecionador de Crepúsculos. BarretoAnna Maria Cascudo.
Brasília: Senado Federal, 2003 )
É evidente que somos bem pouco, muito pouco felizes com a espantosa aparelhagem possuída para fazer-nos conhecer a terra, céu e mar. A vida tornou-se febril e nas cidades grandes são anfiteatros onde o homem se debate, sofrendo como se fosse submetido a uma vivisseção. Os complexos tradicionais de “amigo”, “compadre”, “companheiro” sofrem restrições calamitosas e vão cedendo à maré montante dos interesses crescentes. Vivemos sob o signo da angústia. Angústia significa justamente o nosso estado de compressão, opressão mental, asfixia econômica, hostilidade ambiental.
(Canto de Muro. Cascudo, Luís da Câmara. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1959)

Sobre o seu ofício (preferido)...

Não havendo amor, quase carnal, com a sua especialidade, o professor é um carregador de palavras imóveis e não um piloto de memórias vivas. Aula não é filme, reproduzindo indefinitivamente atos de verismo impecável, mas representação em palco aberto, onde cada exibição é uma atitude responsável e insuscetível de revisão retificadora. 

(Citado em O Colecionador de Crepúsculos. BarretoAnna Maria Cascudo.
Brasília: Senado Federal, 2003)


Sobre o Amor (o seu Amor)...

Domingo, 21 de abril, 39º aniversário do meu casamento. Ao despertar, a noiva de 1929 desaparecera. Fora assistir à missa na capela do Hospital. De regresso, beijos, abraços, congratulações. Dáhlia declara não estar arrependida e me confesso capaz de reincidência com a mesma vítima.

(Pequeno Manual do Doente Aprendiz. Cascudo, Luís da Câmara. Natal: UFRN/Imprensa Universitária, 1969)


domingo, 3 de junho de 2012

A (IR)RESPONSABILIDADE DE INFORMAR

 Determinados programas de televisão _ com gancho em outros veículos de comunicação como rádio, jornal escrito e mesmo internet _ que se dizem “jornalísticos” apresentam-se como verdadeiro “Circo dos Horrores” que, em nada, cumprem a séria missão de informar.

São horários dedicados, geralmente, a fazer sensacionalismo de duvidosa qualidade, ou melhor, de qualidade nenhuma, capitaneados por criaturas engravatadas que, ao proferir as suas mensagens, não respeitam o vernáculo e, pior, utilizam-se de jargões baratos para fazer a moldura de imagens chocantes, tudo com o simples objetivo de atrair uma audiência cujo interesse é apenas observar a desgraça alheia.

Dia desses, ultrapassei a barreira da ojeriza que nutro por esse tipo de programação e me dei ao trabalho de assistir a um desses excrementos televisivos, no caso, da rede local, (e olha que não são poucos...). Na verdade, foi difícil escolher o pior entre os piores. Bem, tudo apenas para constatar o que já sabia: ninguém deve perder o seu tempo para dar palco “àquilo”.

A crítica aqui é, também, para as emissoras de TV que devem ter o mínimo de responsabilidade com a sua programação e oferecer conteúdo de qualidade para os telespectadores. Não se está querendo fechar os olhos para a realidade dos fatos, sobretudo na área policial, mas apenas lembrar que o intuito é informar, advertir sobre os perigos a que os cidadãos podem estar expostos a partir da criminalidade e não espirrar sangue na tela, apenas para atrair e formar pessoas de avaliação crítica duvidosa e vulnerável.

Outrossim, muitos direitos individuais dos entrevistados são desrespeitados a partir da realização das matérias. Em algumas entrevistas feitas com os indiciados, estes, no mais das vezes, são expostos ao ridículo para o simples deleite dos telespectadores e felicidade (comercial) das referidas emissoras. VERGONHOSO!

De ressaltar que a onda de supervalorização do chamado “gosto popular” não deve servir de desculpa para atuações irresponsáveis e descuidadas no trabalho desempenhado, sobretudo por aqueles que trazem em suas mãos a nobre missão de informar.